The Art of Thinking Clearly – Comentários sobre o livro

Uma análise de nossa forma de interpretar informações.

O autor examina, com o olhar da psicologia e ótimos exemplos, a forma consciente ou não, de como interpretamos o mundo por meio das informações que recebemos. E de como essas interpretações influenciam nossas decisões, mostrando que, no final, não somos tão racionais como geralmente imaginamos.

Para isso, ele apresenta 99 pequenos textos, quase como posts de mídia social, que divertem, distraem e levam à reflexão, em seu objetivo de mostrar ao leitor como analisar o mundo e pensar de forma mais clara.

Cada ponto fraco é apresentado com exemplos e histórias que esclarecem de que modo estamos sujeitos, nas vidas pessoal e profissional, aos vieses que levam às más decisões. O autor ainda esclarece que, mesmo conhecendo os mecanismos psicológicos, não estamos completamente livres de cair nas armadilhas.

Algumas conclusões do autor, associadas aos vieses apresentados:

  • O viés de sobrevivência leva as pessoas a superestimar sistematicamente suas chances de sucesso.
  • O viés de confirmação é a mãe de todos os equívocos. É a tendência de interpretar novas informações para que se tornem compatíveis com nossas teorias, crenças e convicções existentes. 
  • O efeito halo ocorre quando um único aspecto nos deslumbra e afeta a forma como vemos a imagem completa.
  • O viés de ação impacta como agimos e como reagimos. Um exemplo: Em uma situação de pênalti no futebol, a bola leva menos de 0,3 segundos para viajar do jogador que chuta até o gol. Não há tempo suficiente para o goleiro observar a trajetória da bola. Ele deve tomar uma decisão antes que a bola seja chutada. Jogadores de futebol que cobram pênaltis chutam um terço das vezes no meio do gol, um terço das vezes à esquerda e um terço das vezes à direita. Certamente os goleiros perceberam isso, mas o que eles fazem? Eles mergulham para a esquerda ou para a direita. Raramente eles ficam parados no meio – embora cerca de um terço de todas as bolas caiam lá. Por que diabos eles arriscariam salvar essas penalidades? A resposta simples: aparência. Parece mais impressionante e menos embaraçoso mergulhar para o lado errado do que congelar no local e assistir a bola passar. Este é o viés da ação: parecer ativo, mesmo que não consiga nada. Ele alerta: A sociedade em geral prefere uma ação precipitada à uma estratégia sensata de esperar para ver.
  • O viés de auto seleção impacta fortemente as enquetes e pesquisas realizadas com pouca técnica ou com má-fé. O autor exemplifica: “Particularmente interessante é uma recente pesquisa telefônica: uma empresa queria descobrir, em média, quantos telefones (fixos e celulares) cada família possuía. Quando os resultados foram computados, a empresa ficou surpresa ao constatar que nem uma única família alegava não ter telefone. Que obra-prima”.
  • O viés de informação. Em seu conto “Del rigor en la ciencia”, que consiste em apenas um parágrafo, Jorge Luis Borges descreve um país especial. Nesse país, a ciência da cartografia é tão sofisticada que só os mapas mais detalhados servem – ou seja, um mapa na escala 1:1, tão grande quanto o próprio país. Seus cidadãos logo percebem que tal mapa não fornece nenhuma visão, pois apenas duplica o que eles já sabem. O mapa de Borges é um caso extremo de viés de informação, a ilusão de que mais informação garante melhores decisões.
  • Ilusão do controle – Atravessar a rua em Los Angeles é um negócio complicado, mas felizmente, com o apertar de um botão, podemos parar o trânsito. Será? O verdadeiro objetivo do botão é nos fazer acreditar que temos influência sobre os semáforos e, assim, aguentar melhor a espera pela mudança do sinal com mais paciência.
  • Ilusão de regressão à média. Performances extremas são intercaladas com outras menos extremas. As escolhas de ações mais bem-sucedidas dos últimos três anos dificilmente serão as ações de maior sucesso nos próximos três anos. Ignorar a regressão à média pode ter consequências destrutivas, como professores concluindo que penalizar é melhor do que incentivar. Por exemplo, após um teste, os alunos de melhor desempenho são elogiados e os de pior desempenho são castigados. No próximo exame, outros alunos provavelmente – por pura coincidência – alcançarão as notas mais altas e mais baixas. Assim, a professora conclui que a reprovação ajuda e o elogio atrapalha. Uma falácia.
  • Tendência de super-resposta de incentivo. Creditado a Charlie Munger, esse nome descreve uma observação trivial: as pessoas respondem aos incentivos fazendo o que é do seu interesse. Bons sistemas de incentivo compreendem tanto a intenção quanto a recompensa. Uma curiosidade: na Roma Antiga, os engenheiros eram obrigados a ficar embaixo da construção nas cerimônias de inauguração de suas pontes.
  • A falácia do custo irrecuperável. O avião Concorde é um excelente exemplo de projeto de déficit governamental. Embora Grã-Bretanha e França soubessem há muito tempo que o negócio de aeronaves supersônicas nunca funcionaria, continuaram a investir enormes somas de dinheiro nele – mesmo que apenas para salvar suas imagens. Abandonar o projeto seria o mesmo que admitir o fracasso. Daí que a falácia do custo irrecuperável é frequentemente chamada de efeito Concorde.

Para compensar nossa fragilidade quanto aos vieses apresentados, ele dá algumas recomendações:

  • Afaste-se passando tempo com pessoas que pensam diferente do que você pensa – pessoas cujas experiências e conhecimentos são diferentes dos seus. Precisamos da opinião de outras pessoas para superar o viés de disponibilidade.
  • Para avaliar a qualidade das decisões, devemos usar as informações disponíveis quando ela foi tomada.
  • Quando você justifica seu comportamento, encontra mais tolerância e ajuda.
  • O pensamento indutivo nos inclina a extrair certezas universais de observações individuais. O filósofo David Hume usou essa alegoria no século XVIII para alertar sobre suas armadilhas.
Com o pensamento indutivo você pode ganhar uma fortuna apenas enviando alguns e-mails. Veja como: reúna duas previsões do mercado de ações – uma prevendo que os preços subirão no próximo mês e outra alertando para uma queda. Envie o primeiro e-mail para 50.000 pessoas e o segundo e-mail para um conjunto diferente de 50.000. Suponha que após um mês os índices tenham caído. Agora você pode enviar outro e-mail, mas desta vez apenas para as 50.000 pessoas que receberam a previsão correta. Esses 50.000 você divide em dois grupos: a primeira metade descobre que os preços vão subir no próximo mês, a segunda metade descobre que eles vão cair. Continue fazendo isso. Após 10 meses, permanecerão cerca de 100 pessoas, todas as quais você aconselhou impecavelmente. Do ponto de vista deles, você é um gênio. Você provou que realmente possui poderes proféticos. Algumas dessas pessoas confiarão em você com seu dinheiro. Pegue e comece uma nova vida no Brasil.
  • “Existem dois tipos de previsores: os que não sabem e os que não sabem que não sabem”, escreveu o economista de Harvard John Kenneth Galbraith. Portanto, seja crítico ao encontrar previsões.
  • Esqueça o cérebro esquerdo e o cérebro direito. A diferença entre pensamento intuitivo e consciente é muito mais significativa.
  • Se alguém usar a palavra ‘médio’, pense duas vezes. Tente descobrir a distribuição subjacente. Se uma única anomalia quase não tem influência no conjunto, o conceito ainda vale a pena. No entanto, quando casos extremos dominam, devemos descontar o termo “médio”.
  • Um aspecto importante nas análises de dados: A ausência é muito mais difícil de detectar do que a presença. Em outras palavras, damos mais ênfase ao que está presente do que ao que está ausente. O conhecimento negativo (o que não fazer) é muito mais potente do que o conhecimento positivo (o que fazer). Warren Buffett escreveu sobre si mesmo e seu sócio Charlie Munger: “Charlie e eu não aprendemos a resolver problemas difíceis de negócios. O que aprendemos é evitá-los”.

Outros comentários que esclarecem o ponto de vista do autor

Respondemos à magnitude esperada de um evento (o tamanho do prêmio ou a quantidade de eletricidade), mas não à sua probabilidade. Em outras palavras: nos falta uma compreensão intuitiva da probabilidade.

As pessoas preferem informações fáceis de obter, sejam dados econômicos, sejam receitas culinárias.

Eventos puramente independentes só existem no cassino, na loteria e na teoria. Na vida real, nos mercados financeiros e nos negócios, com o clima e sua saúde, os eventos geralmente estão inter-relacionados. O que já aconteceu tem influência no que vai acontecer.

A cada ano, o número de acidentes de trânsito aumenta 7%, alerta um político. Sejamos honestos: não entendemos intuitivamente o que isso significa. Então, vamos usar um truque e calcular o ¨tempo de duplicação¨. Comece com o número mágico de 70 e divida-o pela taxa de crescimento em porcentagem. Neste exemplo: 70 dividido por 7 = 10 anos. Então, o que o político está dizendo é: ¨O número de acidentes de trânsito dobra a cada 10 anos¨. Muito alarmante. (Você pode perguntar: ¨Por que o número 70?¨ Isso tem a ver com um conceito matemático chamado logaritmo).

Cuidado com as correlações. Em uma cidade, um estudo revelou que, em cada incêndio, quanto mais bombeiros chamados para combatê-lo, maior o dano causado pelo incêndio. O prefeito impôs um congelamento imediato de contratações e cortou o orçamento do combate a incêndios.

O truque da troca. Digamos que você seja encarregado de duas pequenas filiais de revenda de automóveis na mesma cidade, com um total de seis vendedores: números 1, 2 e 3 na filial A, e números 4, 5 e 6 na filial B. Em média, o vendedor número 1 vende um carro por semana, o vendedor número 2 vende dois carros por semana e assim por diante até o vendedor número 6, que vende seis carros por semana. Com um pouco de cálculo, você sabe que a filial A vende dois carros por vendedor, enquanto a filial B está bem à frente com uma média de cinco carros por vendedor por semana. Você decide transferir o vendedor número 4 para a filial A. O que acontece? As vendas médias da filial aumentam para 2,5 unidades por pessoa. E a loja B? Ela agora consiste em apenas dois vendedores, os números 5 e 6. Sua média de vendas aumenta para 5,5 por pessoa. Essas estratégias de troca não mudam efetivamente nada, mas criam uma ilusão impressionante.

Em 1948, o psicólogo Bertram Forer elaborou uma descrição de uma pessoa usando colunas de astrologia de várias revistas. Então deu para seus alunos lerem, sugerindo que cada um estava recebendo uma avaliação personalizada. Em média, os alunos avaliaram suas caracterizações com 4,3 de cinco, ou seja, deram a Forer uma pontuação de precisão de 86%. O experimento foi repetido centenas de vezes nas décadas seguintes, com resultados praticamente idênticos. O chamado efeito Forer explica por que as pseudociências funcionam tão bem – astrologia, astroterapia, estudo da caligrafia, análise de biorritmo, quiromancia, leitura de cartas de tarô e sessões espíritas com os mortos.

Preconceito e aversão são respostas biológicas a qualquer coisa estranha. Identificar-se com um grupo tem sido uma estratégia de sobrevivência por centenas de milhares de anos.

Risco significa que as probabilidades são conhecidas. Incerteza significa que as probabilidades são desconhecidas.

Procrastinação é a tendência de adiar atos desagradáveis, mas importantes.

A mídia há muito sabe que relatórios factuais e gráficos de barras não atraem os leitores. Daí a diretriz: dê um rosto à história.

“O que o ser humano faz melhor é interpretar todas as novas informações para que suas conclusões anteriores permaneçam intactas.” – Warren Buffett

O livro

Dobelli, Rolf. The Art of Thinking Clearly. Hodder & Stoughton Ltd., London. 2013.

Jul/25

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